Open Call
André Carmo. Nascido e criado numa aldeia da serra tem crescido com a idade e com o Mundo. Desde a ausência de internet até ao desenvolvimento de relógios inteligentes faz uma ponte regular entre a simplicidade e a sofistificação. Existêncialista por natureza, tem o memento mori sempre presente no seu dia a dia, o que lhe confere a liberdade para se debater sobre qualquer tipo de assunto sem tabus nem constrangimentos. Também escreve sobre si próprio na terceira pessoa, o que lhe permite descrever-se com palavras sofisticadas como: ileísta; ou simplesmente: idiota.

Bem numa rua centenária
Havia um espaço privado
Nunca vi aberto, dizia na entrada:
Ervanária
E mesmo sem nunca lá ter entrado
Era lá que eu comprava
Os meus dotes de culinária
Dissertações da caneta
E se eu quiser escrever só para saber se a caneta escreve?
Parece que sim, escreve.
Então e agora? Seria suposto parar de escrever?
Mas afinal, por alguma razão eu queria saber se a caneta escrevia. Nessa não pensei. Porque quereria, e quererei, eu saber se uma caneta escreve?
É porque quero escrever.
Mesmo sem razão, assunto ou motivo aparente, eu quero apenas escrever. Apetece-me, e gosto bastante, mesmo sem saber o quê.
Parece-me terapêutico deixar fluir desta forma meras situações, sensações e sentimentos. Banais ou pontuais, com ou sem qualquer tipo de relevo na vida de pessoas simplesmente normais.
No fim de tudo, acabei por perceber que só quis saber se a caneta escrevia porque eu sentia – e por isso me apetecia – que queria escrever.
Mesmo sem saber como começar, e muito menos como acabar, sem assunto que acabou a ser assunto, acabei de ficar mais leve umas quantas palavras. Talvez estas, mesmo sem sentido, evitem próximas desnecessárias.
Foi de qualquer forma uma excelente iniciativa, como é sempre. E a caneta escreve, e escreve bem.
Dissertações da caneta, parte II
Escrevo pela simples vontade de pegar no objeto de plástico em forma pontiaguda e desenhar caracteres - anómalos a quem não entenda português - que são capazes de desenrolar o nó que existe - não existindo, obviamente – no interior de um ser de natureza humana.
Sem pausas. O meu ego grita desenfreadamente, só quer gritar e não existe razão aparente – pois nada do que é aparenta ser. É como se uma parede caísse a hora de conversa, hora essa que não existe, nem com os próprios botões da indumentaria.
Respira fundo. A raiva parece fluir ao mesmo ritmo da caneta.
Foda-se!
Ops! O tal objeto de forma pontiaguda que ainda há pouco escrevia sem dó nem piedade, agora até já se censura.
Será isto correto? Ou devemos ser nós o que somos natural e espontaneamente? Serão as correções corretas? Ou apenas desejos de aceitação? Serão as correções construtivas? Ou serão resultado da opressão social no ser individual?
Será tempo de ser eu? Como ser eu?